PRIMAVERA 2019: LONDRES EM 5 DESFILES MASCULINOS
Como de costume, Londres abre a temporada de primavera-verão dos desfiles internacionais. Em apenas três dias e com estilistas-âncora desfilando em outras capitais ou apresentando coleções fora de calendário, a semana londrina ainda assim tem sempre algo a dizer.
Nas últimas temporadas, as passarelas de Londres presenciaram uma ondulação diferente no diálogo tecido pelas marcas. A comunicação se estreitou ao ponto do respeitável público passar a desocupar a posição observatória para se tornar componente vivo do ativismo. Imagens de moda apresentadas durante a semana masculina não ficaram imunes a abordagens políticas ou urgências ambientais. Também não abriram mão do falatório sobre a adesão de certas estéticas nas aventuras de vestir o público masculino, neste momento, em que o mercado deles ensaia se tornar algo mais diversificado.
O criativo vs. comercial esteve na pauta de inúmeros designers. O eterno embate sobre moda de passarela, também. Questionar a inovação no ato que lhes põe de frente a escolha entre o espetáculo ou o vestuário que facilite o dia a dia no transporte público, pode ser um comportamento natural para farejar o equilíbrio e a permanência. É o que provoca a discussão pertinente sobre os atuais usos da roupa. O teatral tem sua parcela usual, obviamente. Ou será que a prática do utilitário abocanhou todo o resto? Talvez seja esse o entendimento (que pode ser momentâneo e estratégico) de alguns estilistas ao criar moda que beira a insipidez, mas que reserva alguns traços pungentes como esforço compensatório.
A semana masculina de Londres também tem presenciado a retirada sútil da velha guarda da Saville Row em virtude da afluente entrada de novos nomes do streetwear. No meio de tantas propostas de moletom com capuz, surgem, esporadicamente, escolhas com poder de sacudir o olhar viciado.
Confira abaixo cinco desfiles da LFW:
A COLD WALL
Um exército silencioso, encapuzado, com peles tingidas por argila. Sobreviventes saindo de um escombro, talvez. Marchando em sincronia e fúria contida. Assim iniciou a apresentação da A Cold Wall. Grupos menores do exército desbotado conduziam modelos pela passarela em estruturas metálicas, sugerindo uma ligação escravocrata ao evocar liteiras. A coleção é alicerçada no esportivo, mas o corpo dessa coleção é fundamentado por experimentações de matéria-prima e modelagem. Lá está calça oversized com enchimento e múltiplos bolsos, o casaco estruturado de lã com uma lapela só, assimétricos acolchoados e laminados, numa paleta de cores pastel. Ao final da apresentação, o exército empurra — agora em fúria declarada — um cubo de isopor que é destruído completamente a socos e gritos inaudíveis. Do centro do cubo em destroços, escorrega para fora um homem nu, enxercado por um líquido vermelho. Algo nasceu na passarela da A Cold Wall.
XANDER ZOU
Se na temporada passada, o que chamou atenção na coleção da Xander Zou foram os aterradores sapatos-pés-de-Godzilla, nessa, as possibilidades de surpresa foram tonificadas a última potência. A camisa do primeiro modelo a riscar a passarela lança a mensagem: “New World Baby”. Há de tudo no admirável mundo novo da Xander Zou: homens grávidos, óculos futuristas que terminam em aparelhos odontológicos, médicos cirurgiões com camisas havaianas, sungas que parecem equipamentos de proteção, perucas fluorescentes, sobrancelhas de led, sneakers que viram bota gladiadora de borracha. A paleta vai dos tons pastel aos tons vibrantes num dinamismo apurado. O recorte de futuro da Xander Zou é sério e corporativista, mas permite, ocasionalmente, ser dissuadido pela diversão.
CHALAYAN
Hussein Chalayan talvez não queira mais apresentar coleções da maneira que as apresentava no passado. É sabido: o mundo muda, a moda vira outra coisa e estratégias, neste terreno, são necessárias. No entanto, há algo no fazer de Chalayan que mesmo em energia mínima, invoca uma unicidade que não é possível ser replicada por nenhum outro. A sutileza talvez seja autora do segredo. É na camisa de alfaiataria distorcida, na parka usada como vestido, no suspensório de um lado só que termina em bolso da calça ou no trench coat de lapela deslocada; que a coleção revela o Chalayan de outrora.
ALEX MULLINS
Há algo de primitivo na coleção de Alex Mullins. Os blazers overzise de linho tem aspecto inacabado e as calças com recortes aparentam crueza quando postas em contrastes com coletes de couro de formatos abstratos. As regatas de malhas furadas são postas por cima de blazers como espartilhos que ao invés de revelar timidamente a pele, revelam a roupa em si. Aventais e conjuntos de sarja respingados de tintas encontram acessórios como bolsas em forma de pedra ou esqueleto de camarão.
CHARLES JEFFREY LOVERBOY
O garoto de sobrenome pop é ainda o que há de mais fresco na semana de moda de Londres. E o desfile mais lotado e esperado da semana é também o desfile com mais peças “vestíveis” dele até então. A primeira parte da coleção mostra um importante assentamento do estilista com a roupa comum, sem muita variação de styling. Um esportivo com alguns recortes engenhosos de alfaiataria aqui e ali, estudo de descontração de camisaria, suéters alongados e blazers sem lapela. Só que o lirismo incontrolável de Loverboy não se contenta com minúsculos e logo trata de invadir peças simples alterando a modelagem para algo estratosférico. Rostos e braços são pintados de forma descuidada dentro de peças que parecem chapas plásticas. Patchworks gigantes em terceira dimensão avançam como animais, emaranhados de pelúcias se enrolam por baixo de trench coats e vestidos. E tudo explode em cabeças inimagináveis. Ainda que a intenção não fosse essa, a apresentação vai ao fim com gosto pleno de espetáculo inglês.
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