SPFW: Ronaldo Fraga e a “feiúra” do futebol
Memória, nostalgia e cultura brasileira. Mesmo que não exatamente nesta ordem, é com forças assim que o Ronaldo Fraga realiza sucessivas coleções e traz elas a público, sempre desfiladas de forma narrativa. O que significa que ele adota um tema, desenvolve elementos formais a partir dele e organiza o andamento deste desenvolvimento, e do próprio desfile, como quem conta uma história. Quando adota um tema cuja visualidade tem por trás um autor definido (Athos Bulcão, por exemplo) chega a um resultado. Quando adota um tema sem dono, diluído no caldo da cultura geral (o Carnaval) chega a outro. Parece óbvio, mas não é, e a diferença é importante para avaliar o trabalho dele. Apesar de ter aberto esta questão, não vou me deter nela agora, e sim em uma questão nova, que tomo a liberdade de identificar dentro dessa segunda divisão de coleções, aquelas que adotam um tema sem dono. O desfile que ele acaba de realizar na SPFW toma o futebol como ponto de partida, trajeto e destino. À primeira vista é tentadora a analogia com o tema Carnaval. Uma segunda olhada desmonta esta chance. Agora, que coloquei a questão, devo explicar porque é que acho que é assim. O Carnaval, com todas as evocações visuais das fantasias do passado, colombinas pierrôs entre outras, oferece elementos que encostam na memória afetiva e em uma visualidade dada que é coletivamente aceita como bonita. Ou ao menos como um estado da beleza. No caso do futebol a realidade é outra. Com exceção dos afccionados pelos times para os quais torcem e do fetiche em torno das camisas de jogadores e clubes famosos, o uniforme de futebol não é visto como de bom gosto pela maioria dos participantes ativos do círculo da moda. Não provoca a mesma empatia. Calção, camisão sem forma, listras em cores estranhas e meias brancas até a canela precisam de uma generosa retocada para sensibilizar o gosto fashion. O maior mérito do essa coleção do Ronaldo não é a evocação nostálgica, nem a afirmação do futebol dentro de um dos poucos ambientes onde ele não é unanimidade. O que me parece particularmente significativo é ele ter tratado todos estes elementos visualmente ingratos, incluindo o camisão, o calção e nefasta meia branca, respeitando-os em larga medida, sem trocadilho, na sua suposta “feiúra”.
Imagens Agência Fotosite
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