Milão e a fobia do novo
Não é exclusividade da semana italiana a aversão que a moda atual cultiva pelo que é novo. A frase, que deveria soar absurda é, de fato, a definição do que acontece hoje em escala global. Novidade é um termo, apenas, e existe tão somente nos textos publicitários. Na arena da moda ela quase não acontece. Apenas uns poucos autorizados podem mandar ver, pelo jeito. E eles são raríssimas exceções. A imensa maioria não corre riscos. O problema é que a abstinência deste ingrediente vai causando estragos: mesmo quem tenta já parece desajeitado para a tarefa.
Daí chegamos a Milão. Além da suscetibilidade fóbica dos mercados assustados, existe o histórico local, o da Itália. Sabe-se lá porque, talvez pelo apego ao passado glorioso, Milão não avança. (E aqui o passado vai longe).
Li uma dezena de artigos especulando sobre as causas. A maioria bate na tecla da resistência da velha geração, agarrada com unhas e dentes ao que tem, do ambiente historicamente hostil (considerando a curta história da moda) para novos criadores. Vários tentam apontar alguns candidatos ao posto. Todas as mazelas, dizem os artigos, opõem o velho e o novo em alguma instância. É desta forma que eles explicam o saldo correto, porém sem energia, da semana de moda milanesa. Será que um pernicioso envelhecimento generalizado estaria coagulando o sangue criativo italiano? Entre as ideias que li, houve até quem estivesse contando os dias para que a natureza cumprisse seu papel de renovação, já que não estão assumindo este papel as políticas setoriais. Neste ponto, decidi que era hora de sair dessa frequência e partir para um balanço.
A lista de Milão tem no topo os anos 70 e vai passar por uma infinidade de plissados. Outros pontos fortes ficam por conta da leveza e da transparência, ingredientes para compor looks etéreos, florais grandes, geometrias e franjas. É certo que tem a Prada trafegando acima da média (uma das marcas “autorizadas”, a investigação que ela fez do passado têxtil não poderia resultar mais contemporânea) que a Marni passou muitíssimo bem, mas o hippie requentado, mesmo que vibrante como foi no passado, vide Pucci, e uma técnica antiga não mantém a emoção no volume máximo como deveria.
Seria ingênuo desconsiderar a força do negócio moda na Itália. Também não é esperto anunciar a derrocada do império. (Xô mau agouro!) O problema é que há sim muitas evidências de que algo não está funcionando como poderia. Com tantas marcas no direito e no poder de fazer mais, é perigosa a opção de repetir a receita diante do mundo e de tantos convidados exigentes.
Para nós, brasileiros, e nossa curta história de moda, o padrão italiano funcionou como um modelo para a indústria nacional por décadas. Vivemos deliberadamente à sombra dos produtos e da imagem que o país soube muito bem formatar e vender para o mundo. A debilidade de Milão como modelo seria uma espécie de orfandade. Quem sabe produtiva.
Colaboraram: Bárbara Diehl e Ramon Steffen
Foto: Prada
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