A Alta Costura é a pista de testes da corrida fashion
A analogia esportivo-automobilística tirei de um trecho de matéria do The Guardian. Nela, a autora* explica a sobrevivência da couture em pleno século XXI. De acordo com ela, assim como os construtores de carro exibem os avanços do setor nos modelos de Fórmula 1, os raros e privilegiados integrantes da Câmara de Alta Costura de Paris exibem os seus na passarela. É pertinente, o que não livra a comparação de restrições.
Diferentemente dos supercarros, boa parte dos superlooks tendem a ser conservadores, mesmo quando assimilam tecnologia de última geração. É o caso da coleção Chanel que tem vários processos mediados por computadores e têxteis inovadores. Esta informação vem como um acessório, entretanto. A roupa em si mesma permanece com os mesmos apelos que Madame imprimiu a ela décadas atrás.O look acima não me deixa mentir.
Outro exemplo é fornecido pelo paradoxo explicitado pela Fendi. Para a primeira coleção da marca no seleto olimpo da couture, Lagerfeld manteve o Peta à distância e fartou a plateia com minks e chinchilas de fazer corar ativistas (Ou deveríamos todos nos envergonhar?). Peles estão no topo dos itens de luxo tanto quanto no alto da lista das questões espinhosas em torno da moda. Mas vamos lá: todo mundo fingindo que este não é o ponto!
Estas roupas estupendamente bem feitas são de deslumbrar qualquer um que goste do assunto. Ditada pelo gosto de quem paga por elas, contudo, existe o peso de uma força conservadora, que nem sempre favorece a experimentação. A cada temporada assistimos extasiados o desfile da excelência técnica e, simultaneamente, de relíquias formais e decorativas do passado. Belas, sem dúvida, anacrônicas quase sempre. Mas esta não é a regra, felizmente.
À frente da Dior, Raf Simons não deixa de prestar reverências ao passado da marca, por outro lado, tira o cheiro de mofo deste baú com ideias afiadas e senso formal que enquadra as formas de outrora em chave atual.
Galliano é outro que faz bonito e faz estranho e faz instigante. O palco que é a alta costura se justifica pelas mãos dele. O cara sabe construir roupas de forma inusitada como poucos. Esta qualidade converge muito bem com o perfil enigmático e iconoclasta da Margiela.
Um recurso frequente nesta temporada é a busca por associações com a juventude. Desta água mágica todo mundo quer um gole e, no imaginário dos criadores, o lugar dela é na cultura musical das últimas décadas (e nos comportamentos e estéticas associadas a ela). É por este caminho que Kurt Cobain chegou à passarela de Elie Saab, o punk à da Armani, a cultura clubber à de Schiaparelli.
O psicodelismo aportou em várias coleções ilustres como a de Giambattista Valli e da Dior. O exemplo com pior resultado nesta vertente é o da Versace. Coachella e luxo não se misturaram bem. No way!
Ultrapassando a comparação feita no The Guardian e levando a condição da roupa para um patamar mais adequado à natureza experimental da alta costura (que transcende a questão de tecnologia e diz respeito a formas intangíveis de expressão) está a coleção Viktor & Rolf. Em outra bem sucedida simbiose entre reverência e deboche a dupla protagonizou uma performance impagável cutucando antigas questões entre moda e arte.
Resumindo: cada vestido, depois de desfilado, era montado na hora, como um quadro, na parede ao fundo. O fato das molduras serem clássicas não é mero detalhe.
Para finalizar esta conversa sobre alta costura é preciso dizer que ela vende, e bem. Em um mundo de alta concentração de renda os super ricos mantém a chama acesa adquirindo vestidos que custam como custam carros e apartamentos de luxo.
Dados recentes*: Chanel – aumento de 20%. Valentino- crescimento de 30-35%.
Outro dado: A idade média dos clientes de alta costura tem caído de 40 para 30 anos.
E outro: China, Rússia e Oriente Médio injetam a maior parte do dinheiro que sustenta a couture.
* Hannah Marriott
*WWD
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