Mensagens de Londres
Diante de dezenas de desfiles de uma semana de moda, é tentador ceder ao impulso por generalizações. O problema é a pressa levar à superficialidade, bem entendido, e não a tentativa de edição. Afinal de contas, é uma necessidade profissional resumir essa enxurrada de informações ao que é essencial. E um prazer.
No caso da London Fashion Week, me agrada muito o processo. Primeiro porque na moda apresentada por lá, em boa parte dela, ao menos, preserva-se o gosto pela experimentação. Para cada proposta sem consistência há sempre uma contrapartida de inesperado, de tentativa. O que pode ser visto como sinal de qualidade.
Mas, chega desta conversa de Londres criativa. Vamos ver se essa imagem reforçada aqui corresponde de verdade ao que foi apresentado por lá.
Vou começar pelo Christopher Kane e sua curiosa apologia do plástico como material possível. Tão difícil operar com esta matéria prima e lá vai o rapaz se meter com ela. E não é que ele se sai bem? O plástico não é confortável, está associado a algo barato e ainda assim Kane lançou mão dele sem moderação. Para agravar o desafio, mas também como um sinal de coerência, deu cores ácidas à coleção. São bonitos e inesperados os vestidos assimétricos, e ultracoloridos.
Outra coleção a ser mencionada é a da Simone Rocha, uma curiosa junção de perversão e candura. Explico: mesclada com a influência japonesa, estes vestidos aparentemente românticos carregam algo de bondage. Elementos antagônicos convivendo em harmonia em um universo estranhamente familiar. Ou seja, uma condição que define boa parte da LFW.
Falando em contrapor elementos disparatados e dar-lhes uma boa convivência, não há como não chegar ao J. W. Anderson. É preciso dizer que misturas, no caso dele, não soam gratuitas, nem tampouco as partes parecem rebeladas. Acomodam-se para render uma assinatura visual que vai se tornando inconfundível
A frase está marcada porque ela faz parte de um texto sobre ele já publicado no site. Clique aqui para ler mais.
Outro desfile muito bom é o da Mary Katrantzou. É recente a chegada dela ao mercado e a cada estação vale comemorar que ela tenha “acontecido”. Acumulando qualidades como designer capaz de revolucionar o uso de estampas e de construir roupas escultóricas, ela agora entrega uma versão hiperdecorada e, literalmente, brilhante do folk que é de encher os olhos.
Indicaria também o Jonathan Saunders. Em fase de expansão, por conta da entrada de investidores no seu negócio, ele faz o que sabe fazer melhor, usar uma vasta gama de cores e padrões em cortes que rendem excelentes composições assimétricas. Cheia de energia esta coleção.
A dupla da Marques´ Almeida, que recentemente levou para casa o prêmio LVMH – nada desprezíveis 300 mil euros e muita atenção do mercado a reboque- opera com uma roupa que pode ser considerada geracional. No sentido de que parece mirar a garota contemporânea que se coloca à frente da cena. O que distingue essas misturas de bohemian, grunge, biker, de tecidos diáfanos e outros encorpados, tudo junto, é que a mistura é feita com personalidade e inventividade. Confira para ver se é ou não assim.
Sobre a Burberry, há sempre o que dizer, isto porque Christopher Bailey sabe usar a tradição da casa enquanto cuida de manter a marca em sintonia com o tempo presente. Além de já ter feito desfiles transmitidos ao vivo, parceria com a Apple Music, ele também cuidou para que a esta coleção, em desfile acompanhado por um concerto ao vivo, chegasse ao Snapchat. Com mídias atuais e suporte dos investidores, Bailey pôe em cena os bons e velhos trenchcoats na companhia de muitos vestidos em renda, transparências e correntes pesadas nos acessórios.
Não esquecer que Londres tem Peter Pilotto, sempre muito bom, Vivienne Westwood, Paul Smith e o misto de rigor e sensualidade da brasileira Barbara Casasola.
Arrisco algumas orientações: cores ácidas, misturas, zonas de passagem, impressões que vão do suave ao forte, muita assimetria.
Uma síntese? Do it on your own way!
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