O vestido de rolo
Lá estava eu, pasmo pela milésima vez diante do engenho da criação popular. Percebendo meu interesse, o professor que me guiava na visita ao Mercado Central de Fortaleza adiantou: “são vestidos de nó, ou vestidos de rolo. O corte deles é enviesado, veja só, depois são enrolados assim como ela está fazendo” (sem ser convocada, a vendedora executava os movimentos de demonstração em sintonia com a fala dele) “e transformam-se nesses vestidos que são muito fáceis de carregar e de guardar. Eles vestem praticamente qualquer tamanho.”
Já aberto e apoiado sobre o corpo solícito da vendedora, o vestido de viscose enrugada e de alças finas pendia mole e convincente até os joelhos dela. “O ligeiro movimento evasé é acentuado por estes dois cortes aqui embaixo, nas laterais, que abrem o desenho na barra.” Exata, era a fala dele e exatos eram o desenho e o corte. Tentado a repetir a usual ladainha de admiração turística, poupei os ouvidos do meu acompanhante e guardei a fala volátil para transformá-la em palavras de respeito nesse post. Para ser rigoroso, devo dizer que desconheço a origem do tal vestido. “Talvez tenha aportado por lá vindo da Índia, trazido pelos hippies dos anos 70” ponderou uma amiga mais tarde, escavando alguma memória do próprio guarda roupa, quem sabe. Pode ser, o que sei é que o vestido de rolo vende com síntese de hai kai uma centelha perfeitamente útil, perfeitamente transitória, da graça da moda feminina por singelos 10 reais, e isso no varejo!
Issey Myiake e outros japonismos rondavam minha cabeça naquela hora e rondam agora. Inevitável, referências são irreversíveis, mas como estou seguro de que nem a Pleats, Please! nem nada semelhante andou por ali, gosto ainda mais do preço e do resultado do subestimado vestido de rolo.
Imagens: vestido de rolo e cenas do Mercado Central de Fortaleza. Radar Consultoria.
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