Curador Eduardo Motta fala sobre a instalação “Suspension” de David Lee

Curador Eduardo Motta fala sobre a instalação “Suspension” de David Lee

15 de fevereiro de 2019 Moda 0

Instalação “Suspension” de David Lee. (Foto: Daniela Luquini)

Para a edição 2019 do International Fashion Showcase, o Senac Ceará ofereceu todo o suporte necessário para a participação do cearense David Lee. A instituição também concedeu ao designer um espelhamento no Brasil da mentoria que ele recebeu na Inglaterra, através do curador Eduardo Motta, que concebeu a instalação em Londres.

Meses foram necessários para se chegar a versão final e apropriada do projeto que representaria nosso país lá fora. Abaixo, você confere texto de Motta contanto sobre o processo de desenvolvimento conceitual e a montagem da instalação “Suspension” de David Lee.

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Movido por uma intuição infalível de que a roupa pode mediar questões relevantes, David Lee entrelaça cultura regional e urbanidade com intensidade manipulando técnicas distintas cores fortes e formas volumosas. Mas quão significativas podem ser as roupas hoje em dia ? Elas ainda estão investidas do poder de iluminar ideias que realmente importam? Inteligentemente, David não as aborda apenas na dimensão da aparência. Ele as trata como o que elas realmente são: eventos engendrados no alinhamento de condições históricas, sociais e subjetivas movendo e ampliando os limites atribuídos à roupa em geral e à roupa masculina em particular.

A instalação que apresenta a coleção de David na Somerset House, em Londres – neste projeto apoiado pelo Senac Ceará – adota referências e recursos variados para encenar o equilíbrio improvável que o designer estabelece entre  forças opostas, entre o que é íntimo e o que é público, entre imobilidade e movimento, entre fragilidade e força, entre o artesanal e o industrial, entre regional e global capturando estas oposições em estado poético de suspensão.

Uma referência que ajudou a dar forma definitiva à instalação é a bem conhecida passagem de um grupo de astrônomos ingleses pelo estado do Ceará, em 1919, à procura do ponto ideal de observação para registrar um eclipse. Os registros da jornada marcaram a história da física moderna permitindo estabelecer as primeiras comprovações experimentais da Teoria da Relatividade de Albert Einstein.

O impacto da presença desses astrônomos na população local evoca o contraste entre o conhecimento científico e as crenças religiosas dos moradores da cidade de Sobral, que suspeitavam que o fenômeno prenunciaria o fim do mundo. As imagens e as descrições registraram ainda uma intensa tonalidade de luz alaranjada durante o fenômeno adotada na instalação.

A oposição entre luz e escuridão, física e metafórica, se somou a outras já citadas para definir um espaço simultaneamente estático e em transformação. Manequins cujos movimentos não são os dos corpos da moda vestem a coleção. Eles estão unidos por vigorosas tramas cenográficas de crochê de fios grossos e negros, também estão suspensos de estrutura de vigas de madeira alusiva à de um barco em ( des)construção.

Na  moda proposta por David Lee estão as funções e a aparência que desejamos nas roupas, e estão lá também os subtextos, o que se pode ler e ver nas entrelinhas, nos avessos, nos pontos em que partes se juntam a outras criando elos físico e formas de comunicação entre as roupas e quem as veste ou apenas as vê. A instalação é um condutor das potências que elas encerram. Um reconhecimento de que David está certo e de que suas roupas tem muito a nos dizer.

Eduardo Motta – Curador / Porto Alegre, 2019.

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