EXPOSIÇÕES RECENTES SE POSICIONAM ENTRE O TECIDO, O CORPO E A MODA

EXPOSIÇÕES RECENTES SE POSICIONAM ENTRE O TECIDO, O CORPO E A MODA

14 de junho de 2018 Moda 0

Peça da exposição de Olivier Theyskens “She walks in Beauty” no MoMu.

O ato de vestir intriga antropólogos há bastante tempo. Não só a eles. Filósofos, sociólogos, psicólogos e boa parte de todos nós, em algum momento já nos voltamos para o assunto. Para alguns, a preocupação é diária; para outros, meramente indireta. Mas… por que cobrir-se? O que é roupa? Quando deixa de ser? Moda é roupa pura e simplesmente? Roupa é roupa e nada mais? Três exposições diferentes — duas delas no FIT, em Nova York e outra no MoMU, na Antuérpia — investigam, cada qual à sua maneira , o ato de se vestir. Entre o corpo e o tecido, a moda observa. 

O TECIDO

Leva um milésimo de segundo para alguém perceber que estamos vestidos. O milésimo seguinte é dedicado ao tecido. A aparência que recobre nossa pele real é a pele que o mundo está habilitado a ver e deduzir dela o que bem entender. Antes mesmo de existir costura, design ou qualquer noção de moda, o tecido já desenvolvia o papel de guardar significado maiores do que simplesmente o de cobrir o corpo desnudo.

Para os egípcios, o linho era o tecido mais nobre, destinado exclusivamente a Faraós e descendentes dos deuses. Assim pensaram posteriormente os romanos, cujos metros e metros de tecidos sem costura apoiados sobre o corpo permitiam anteceder discursos solenes ou batalhas. Séculos mais tarde, a bordo de um filme hollywoodiano, a personagem Scarlett O’hara entrou para o imaginário da moda com um vestido feito de cortina. O tecido não é a moda, mas ele é a  plataformas que a moda utiliza para fazer a mágica acontecer.

De 4 de Dezembro de 2018 a Maio de 2019, o Fashion Institute of Technology, FIT, em Nova York, recebe a Fabric in Fashion, mostra que explora o papel desempenhado pelos têxteis na formação da silhueta da moda ocidental nos últimos 250 anos. A exposição mergulha na mecânica dos têxteis, partindo da observação de como fibras e tecidos constroem a materialidade da moda.

Também explora a influência cultural do tecido, a demanda do mundo ocidental por têxteis de origem oriental, como a rota da seda, e examina como as propriedades físicas de tecidos específicos determinam a maneira como uma peça de roupa interage com o corpo, e como o design e as associações culturais dos têxteis revelam o contexto social e as motivações que impulsionam a moda. A exposição é organizada por Elizabeth Way, curadora assistente de figurino do FIT.

O CORPO

Base para a roupa, o corpo é palco para inadequações, transgressões e revoluções. É a intervenção, a readequação e a expressão que dá forma ao relacionamento entre a moda e a superfície em que ela é posta. Para Vivienne Westwood “moda é estar eventualmente nu”.

Há dois meses, o MoMu — Museu de Moda da Antuérpia — recebeu a exposição She Walks in Beauty, uma retrospectiva dos últimos 20 anos de trabalho do estilista OIivier Theyskens.

A escolha do título She walks In Beauty — um texto de 1814 de Lord Byron — é mais do que apropriado para falar do trabalho do estilista belga. A expertise com traços de Alta-costura que ele impunha há mais de duas décadas transitou por musas de identidades díspares, por estéticas que foram do americano pragmático ao francês rocambolesco, desafiando texturas e formas e imprimindo sua fixação pela beleza.

Theyskens nunca seria um Alaia. O corpo para Alaia era o corpo como visto nu. O processo de moulage do estilista construía quase que uma segunda pele, uma fina casca que revestia cada curva e relevo da corporalidade. Para Theyskens, o que se projeta para fora dos limites da carne é o terreno de criação da moda.

Esta conversa faz lembrar a penúltima exposição do MET, em Nova York. Dedicada à estilista japonesa Rei Kawakubo, a maior reinventora de corpos que se tem notícia na moda atual, a mostra reavivou a presença do trabalho dela em uma sucessão de criações que discursavam sobre a ditadura do corpo, apresentando modelagens em morfologias para corpos inexistentes.

A MODA

Moda não é a roupa, mas o que ela “diz”. A voz que acompanha e comunica silenciosamente o que vestimos. Moda está no compreender, no mover, no escolher. Eventualmente, aprisionada como observadora do corpo e do tecido.

O que acontece postumamente com essa a roupa é o tema da exposição Fashion Unraveled que estreou no FIT, em Nova York, no dia 25 de Maio e vai até 17 de Setembro deste ano. Em vez de apresentar roupas impecáveis ​​que exemplificam um tema, um período ou a estética de um designer, a mostra explora os papéis da memória e da imperfeição na moda. Destaca a beleza subestimada dos objetos imperfeitos, dando prioridade a peças de vestuário que foram alteradas, deixadas inacabadas ou desconstruídas. A curadoria ressaltam um fato elementar sobre a roupa: a ideia de algo que foi criado para o uso, projetada para o desgaste.

Vestígios de corroído, bainhas encurtadas e consertos cuidadosos podem ser encontrados até mesmo em desenhos de alta costura. Essas alterações significam o valor econômico e emocional duradouro das roupas e, em alguns casos, desafiam o conceito de moda como uma mercadoria descartável, estritamente efêmera.

Botas Maison Martin Margiela, 1990.

 

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