Incerteza Viva : a Bienal do assombro diante do mundo

Incerteza Viva : a Bienal do assombro diante do mundo

8 de setembro de 2016 Arte, Calendário, No Radar, Opinião 0
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De-Extinction – Vídeo de Pierre Huygue

A câmara vagueia por imagens que não se sabe bem se pertencem à ficção científica ou a um mundo primevo, fincado lá na origem das coisas. Patas, antenas e carapaças de insetos minúsculos ganham escala monumental e dimensão de mistérios inescrutáveis no vídeo majestoso que roda no segundo andar da 32 Bienal. Estarão os insetos mortos para sempre ou prestes a acordar de um sono imemorial?

Daí você atravessa a enorme sala escura e se mete em um ambiente inóspito e triangular varrido pela luz do dia e coalhado de insetos vivos.

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De-Extinction – Instalação complementar de Pierre Huygue

“Trabalho pancada esse” comentou um amigo, sem melhores palavras para descrever a experiência e tentando afastar o enxame que voejava sobre ele. Justiça seja feita, talvez ele não estivesse privado de adjetivos mais adequados. Minutos antes estávamos postados diante de caixas que reproduziam sons tão graves que nos penetravam pelo estômago, ossos e pulmões: pancada! Também cruzamos a menor dimensão de uma extensa faixa de assoalho instalada como uma elevação suave no caminho de quem visita a Bienal. Você pode ultrapassá-la sem que o ato pince da sua percepção algo além da indiferença oferecida por um chão igual aos outros, ou pode ser capturado por uma das áreas instáveis ocultas ao longo dela. Pancada outra vez.

Não é que essa Bienal nos proponha uma sucessão de acidentes sensoriais. Longe disso. Com raras oscilações de potência, as obras expostas costuram um mundo complexo e conflitante, e fazem isso sem forjar o contato com ele como um carrossel de emoções. Na real, se considerarmos que esta Bienal cumpre o que promete, entregar incertezas vivas, ela é desafiadoramente acolhedora. Desde o primeiro momento em que entramos no edifício modernista no Parque do Ibirapuera ela nos acolhe, da mesma forma que acolhe um sem fim de contradições. Mesmo as mais aviltantes, ela compartilha com sutileza e sem sombra de arrogância diante da nossa condição de expectador. Miserável ou grandioso, o mundo que a Bienal espelha parece irremediavelmente engendrado por todos nós.

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TabomBass – Obra de Vivian Caccuri

Ao expor este mundo – reincidentemente cruel na sua naturalidade – um dos grandes feitos da curadoria é tocar em feridas profundas sem manipular nossas reações diante do desconcerto causado pela provocação. Entramos em um estado crítico e reflexivo, mas de incontornável coexistência.

Contribuem para este resultado a fluidez da arquitetura expositiva e a costura sensível entre obras que se interpenetram e nos interpelam todo o tempo, sem pontos mortos, sem sustos ou apaziguamentos fáceis.

Objetos e sinais emitidos por tecnologias e ritos – ancestrais e do presente – , pela desagregação política e sociocultural, pela espiritualidade, pela arte e outras formas de pensar o mundo, pelas infinitas unidades de medidas que usamos para avaliá-lo ou classificá-lo, aparecem organizados por um persistente colecionismo. Majoritariamente, é este impulso que expõe, articula e confere significados aos signos, imagens e objetos arranjados diante de nós. Nem por isso eles parecem menos enigmáticos: não sabemos mais deles porque os organizamos.

Sem negar o espírito científico, a Bienal certamente apresenta – e o faz de forma generosa – outras maneiras de abordar o assombro diante do mundo que ajudamos a construir.

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Chão – Obra do escultor José Bento

32ª Bienal de São Paulo: Incerteza Viva
7 de setembro a 11 de dezembro
Das 9h às 19h
Pavilhão da Bienal – Parque Ibirapuera, Portão 3
São Paulo

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