Moda na Argentina

Moda na Argentina

12 de agosto de 2010 Moda

Esta é a segunda vez que compareço à semana de moda Argentina, a BAFweek, aqui em Buenos Aires. Rigorosamente, não há como avaliar o que se passa neste país de acordo com o que acontece aí no Brasil. Ok. Estamos falando de roupa e comércio em ambos os casos, mas aqui se é lembrado todo o tempo que moda não é só isso. E é desde a partida que as motivações e os contextos culturais apresentam diferenças. Eles podem convergir na condição de produto e negócio, ou podem se distanciar a perder de vista em outros pontos. A cena aqui é compacta, gira em torno de Buenos Aires, e nela se distingue de forma muito particular o que é moda massiva de moda de autor, por exemplo. Não é difícil entender do que estão falando nesse caso. O que não é fácil é perceber as nuances de valor que uma coisa e outra desfrutam.  Produzir pouco, ser pequeno e não adotar a sazonalidade das tendências não joga os diseñadores que optam por isso no limbo, nem em termos de status nem em termos comerciais.

Não se fica à margem ao disparar opiniões como a emitida pela Nadine Zlotogora, que afirma não gostar de moda com todas as letras, mesmo que mantenha loja na badalado Palermo e figure em várias edições da BAF. A designer vincula sua produção a uma poética estritamente pessoal, na fatura e na concepção. As séries são pequenas, os elementos materiais se acumulam a cada temporada, nada é descartado e motivações sociológicas ou questões ambientais e subjetivas podem surgir no discurso dela (e de vários outros) todo momento. Generalizações podem ser perigosas. A Nadine tem apenas uma loja, o trabalho dela é profundamente artesanal e o turismo em Palermo sustenta boa parte do seu faturamento. Só que não faltam exemplos semelhantes, que se repetem a ponto de constituir um tecido singular.  E, na mesma cena em que a moda massiva leva para um desfile exatamente o que leva para as araras, fermentam valores complexos, compartilhados por criadores egressos de grupos surgidos em algum ponto na passagem dos anos 90 para os anos 2000. Eles se individualizaram ao longo da última década, e quase todos mencionam uma data em torno de 2001 como um momento chave neste processo. Com certeza, a crise econômica na Argentina deste período tem peso nesta história.

Cedendo ao apelo das comparações, no Brasil a profissionalização da moda anda de trem bala em velocidade japonesa. Aqui na Argentina a semana de moda carece do mesmo punch em quase todos os aspectos e, de acordo com os valores sedimentados aí, os negócios de autor daqui provavelmente causariam pouca impressão sobre as projeções de negócios. Entretanto, como ensina a sabedoria, não se conhece nem se desfruta do melhor de uma cultura sem entender o que ela tem de particular. No que diz respeito à moda, esta distinção argentina entre vertentes autorais e outras comerciais (compartilhada por um público que me parece significativo) somada à invejável articulação conceitual dos diseñadores locais,  encaminha a produção daqui para um outro formato.  O amadurecimento da estrutura, a definição do caráter, e a sintonia fina da moda argentina com o mercado interno e externo, passa por aí, inevitavelmente. Imagens: bastidores de uma campanha da BAF; Nadine Zlotogora na sua loja de Palermo; cena de desfile de aluno da Universidade de Moda de Buenos Aires que abriu a semana.

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eduardo: