O retrato de Vivienne
Westwood, uma espécie de Johnny Rotten de saias, tornou-se figura lendária, criadora e criatura da moda. Entre os feitos, vale lembrar que à imagem de musa punk ela acumulou a contraditória condição de dama do Império Britânico, honra concedida pela Rainha em pessoa, como manda o protocolo. Atualmente faz desfiles aclamados em Paris e parece muito distante do começo de carreira, onde causava alvoroço na Londres turbulenta. Na verdade, a senhora de cabelos vermelhos ainda é uma força incontrolável, e conduz uma das poucas marcas em que se pode ver por trás da etiqueta uma história de choques e rupturas como se supõe que a moda possa ter.
Com boa parte da produção atual assepticamente planejada, é altamente recomendado voltar os olhos para os criadores dessa linhagem da contravenção, entre os quais a inglesa reina absoluta há quase quatro décadas. Isto se a idéia for manter a moda respirando.
Brotando da tela do laptop, Vivienne me observa meio torta enquanto digito essa pequena homenagem. Escrevo a bordo de um avião. Cá do alto, olho para o mundo lá embaixo, para o que de menos hipócrita ele se tornou nestas últimas décadas graças a gente como ela, de imagem pessoal cheia de fissuras e trajetória acidentada levada a público. Nestes 1300 caracteres vou deixar sua costura de lado e dedicar todos eles às rugas, aos dentes cheios de intervenções, e à inigualável boca de desenho libidinoso dessa mãe errática e perturbadora das passarelas. O retrato de Vivenne é o anti-retrato de Dorian Gray.
publicado originalmente no usefashion journal – edição revista
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