Sobre bloggers, ética profissional e moda de rua
Alheia aos interiores aquecidos, a multidão do lado de fora das salas de desfile em NY, Londres, Milão e Paris, ignorava o frio e se pavoneava com figurinos de fazer inveja à coleção experimental. Não bastasse o fenômeno por si só, Suzy Menkes, a decana editora do Herald Tribune, congelou de vez os humores catalisando a irritação crescente de parte da imprensa especializada com a multidão de blogueiros que invadiu as outrora exclusivas vias de acesso aos desfiles. Muitos aceitam “subornos”, para elogiar coleções; “traem a principal regra do jornalismo profissional”, ela anotou no artigo que chegou ao New York Times. Outro editor peso pesado, Tim Blanks do style.com, resfriou ainda mais o ambiente ao comentar em vídeo o que acontece em torno dos locais de desfiles. Blanks tratou com ironia o apetite dos fotógrafos pelos candidatos a celebridade instantânea. Nem a colega Anna Dello Russo, editora da Vogue Japão e uma espécie de musa da tribo especializada em vestir-se para frequentar porta de desfiles, ficou a salvo. Ela aparece em cena de rua repetindo movimentos para criar uma falsa cena de ação enquanto os fotógrafos se deliciam com a performance dela. É dele o comentário implacável: “Isto cria monstros, e não deuses”.
Uma guerra de gerações pode ser detectada neste bate boca. A arma que não é secreta é a tecnologia. Entre os novos atores deste jogo, poucos são jornalistas da tradicional imprensa escrita, ou mesmo especialistas no assunto moda. Querem dizer o que pensam e documentam com implacável destreza nos seus twiters e instragrans tudo aquilo que rola dentro e fora das salas. São lidos e vistos por milhares de seguidores. Ocupam em segundos o espaço arduamente conquistado por profissionais durante anos de estudo e trabalho e não há como esta situação não incomodar muita gente. Também não há como reverter o processo que, de resto, segue a volatilidade das mudanças impostas pelos recursos dos gadgets eletrônicos, gostem ou não a Sra. Menkes e o Sr. Blanks. Sobre Menkes, vale dizer que é sensível o discurso dela em torno de ética e qualidade crítica. Por outro lado é risível a sugestão esboçada ao final do polêmico texto de anunciar desfiles em um endereço e realizá-los em outro, apenas com a presença de profissionais “sérios”.
Mais que o incômodo burburinho na entrada dos shows, que o exibicionismo desenfreado, que a possível escassez de princípios éticos e que a provável má qualidade dos textos publicados em blogs, o que é preciso observar é a crescente diluição das fronteiras entre passarela e rua, entre a moda proposta por marcas e a moda praticada de forma independente e individual por qualquer um. Este é o aspecto deste fenômeno que deve ter efeitos colaterais imprevisíveis sobre a moda que conhecemos hoje.
Imagem vogue.com
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