Dádivas na era do Capital

Dádivas na era do Capital

30 de maio de 2014 Arte 0

2Ensaio Sobre a Dádiva, instalação que Nuno Ramos apresenta na Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre, é uma citação e uma homenagem explícita ao livro do antropólogo Marcel Mauss. Ele instala, no espaço da Fundação, um sistema de múltiplas trocas. As primeiras são com a arquitetura. O projeto do Álvaro Siza impõe um contraponto para qualquer artista que se intrometa naquele espaço. O trabalho do Nuno não apenas leva isso em conta como se estrutura a partir dele. Há também as trocas entre as palavras, as imagens/objetos, as imagens fílmicas e o rol de citações que ele arregimenta (Caso da figura do Pierrô e da carga simbólica que este personagem arrasta junto com ele vinda do território da arte). São interações que não se fecham antes se estendem umas dentro das outras. Não como sequências, nem como descontinuidade ou looping. A variedade de momentuns estabelecidos pelas grandes peças esculturais (fragmentos), pequenos objetos, pela música de Noel Rosa reproduzida em um gravador e pelos vídeos, compõe um estado indivisível de encantamento, paradoxalmente mediado pela multiplicidade (dos elementos e dos recortes espaciais impostos pela arquitetura). O curador e autor do texto do catálogo, Alberto Tassinari, usou esta palavra encantamento para falar do trabalho do Nuno e eu replico o termo aqui. Faz todo sentido, particularmente quando se trata deste ensaio sobre os sentidos de dar, receber, retribuir e dos simbolismos associados a estas trocas desde os tempos imemoriais até o nosso ferozmente regulado pelo capital.

1Aproveito para retribuir aqui outra instância de troca acionada pela exposição, aquela que o cuidado com a produção estabelece com o visitante. O catálogo, vendido por preço acessível, estava pronto e disponível no momento da abertura, recheado de imagens da própria exposição e de longo e bom texto do curador. Não há sinal de pressa no material, o que torna a realização ainda mais admirável. Apesar de não ser o centro da coisa, esta não é, com certeza, uma dádiva irrelevante entre aquelas com as quais um artista presenteia o público.

3

Sobre o autor

eduardo:

0 Comments

  1. César Brandão

    24 de junho de 2014
    Responder

    Excelente cobertura da exposição de Nuno Ramos na Iberê Camargo. Parabéns.

Compartilhe a sua opinião!

Seu e-mail não ficara público. Campos requeridos estão marcados com *

Deixe um comentário