Lagerfeld azeda a festa

Lagerfeld azeda a festa

1 de novembro de 2013 Moda, Opinião 0

karl-Lagerfeld

Não fui à festa da Chanel que aconteceu na Oca, em SP. Li a respeito em um texto de teor raro na mídia nacional que trata do assunto moda, assinado pela Heloísa Tolipan. Saudada por alguns como a maior festa fashion já ocorrida em território nacional, parece que a estratégia promocional da marca francesa azedou em função do comportamento  mal educado do Kaiser Lagerfeld. Lamentável, mas não me surpreende. Sobre Lagerfeld escrevi algo há alguns anos atrás e engrosso a fileira dos descontentes com esta postura de prima donna de ópera bufa, como bem anotou Heloísa, copiando um trecho do texto Luxo, Deuses e Pneus. Livro:  O Lugar Maldito da Aparência – Editora Estação das Letras, SP, 2013.

Em parte da moda produzida hoje, a nostalgia pelo luxo aristocrático é conservadora e desemboca na insustentável unilateralidade da experiência. Tudo deve ser necessariamente, bonito, chic, elegante e luxuoso. Essas exigências distorcem os fatos, nublam a apreciação pela falta de enquadramento histórico e conduzem ao desentendimento do teor pop/democrático do tempo em que vivemos.
Vou tomar Karl Lagerfeld como modelo, para desenrolar esta conversa. Indiscutivelmente hábil e talentoso, ele é um irradiador de comportamentos e modelos estéticos atrelados ao passado. Talvez por isso seja tão bem sucedido no comando da Chanel. Não tanto pelo caráter revolucionário do que faz por lá, mas por ter encontrado um ponto de equilíbrio entre a tradição e a capacidade de despertar o interesse de um público jovem em fazer parte dela.
Logo no início do documentário “Signé Chanel”3, sobre os processos de confecção de uma coleção de alta costura, um exército de costureiras e prestadores de serviços gravita zeloso em torno do grande Kaiser, enquanto ele aguarda os momentos de inspiração. Em desfile de verão em Paris, Lagerfeld criou outra cena tão reveladora quanto, colocando na passarela um imenso leão dourado. Afagar símbolos ostensivos de poder e cultivar a imagem mítica do criador aristocrático e genial, como sugerem os dois casos acima, é um modelo supostamente em ruínas, do qual Lagerfeld faz uso em doses altas. Ele escapa da armadilha, combinando o triunfalismo kitsch com estratégias atuais. Contrata a musa pop do momento, mantém a silhueta pessoal de acordo com o gosto contemporâneo e toma banhos diários na fonte da eterna juventude comercial, cercando-se de garotos e garotas, belos e saudáveis.
Karl assinou um calendário da Pirelli. Na época ele exagerou afirmando que inventou “um novo conceito de beleza”. Na verdade, encenou, em preto e branco, um passado clássico e tecnicamente acadêmico, inspirado nos deuses da mitologia grega. A Grécia de Lagerfeld é a Grécia idealizada pelo Classicismo. Não há novidade nela, nem ao menos na erotização da figura masculina, implantada em um calendário, que na origem frequentava a parede da borracharia só com imagens femininas.
Lagerfeld é, talvez, o último representante dessa transição entre a velha e a nova leva de profissionais da moda, entre diferentes entendimentos do que ela significa. É um profissional de enormes talentos. De toda forma, o melhor é não levá-lo tão a sério. Dessa maneira, fica mais fácil admirar os feitos reais e divertir-se com os maneirismos e anacronices, sem tomar umas coisas pelas outras e perder o senso crítico.

Para ler o texto de Heloisa clique aqui

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