Moda e outras coisas

Moda e outras coisas

18 de maio de 2009 Crônicas, Moda 0

Fui atrás de um livro sobre moda do filósofo escandinavo Lars Svendsen. Infelizmente, como a obra ainda não foi traduzida para o português, não figura nas livrarias. Uma coisa leva a outra, e em uma delas encontrei um título diferente do mesmo autor, ‘A Filosofia do Tédio’. Como dá para perceber, o assunto não era nem aproximado, contudo, ambos interessaram ao filósofo, e como o filósofo me interessava, voltei sem a ‘Moda’ e com o ‘Tédio’ para casa. Embora a troca pareça estranha, terminei por achá-la justa. É que no livro encontrei uma das boas reflexões que me caíram pela frente nos últimos tempos. É parte de um poema do T S. Eliot, que em dado momento se pergunta: Where is the knowledge we lost in information? (Onde está o conhecimento que perdemos na informação?). Voltando ao Svendsen, uma das coisas que ele diz sobre o tédio é que ele se instala quando há um déficit de significados. Todo mundo quer que sua vida faça sentido. Quando não faz, é tiro certo, somos arrastados sem esboçar resistência para a margem do desinteresse. Joguei a frase na internet e colhi algumas opiniões interessantes. A maioria delas lembra que seria bom voltar-se para os livros. Concordo. Semana que vem deixo o tédio em casa e volto à livraria em busca do que é que a filosofia tem a dizer sobre a moda.

Moda e Viagens

A história do homem é a história das viagens, da odisséia de Ulisses, Odisseu em grego, às nossas pequenas e preciosas fugas de feriado. É nas viagens que coletamos informações, alguma experiência e um mínimo de capacidade de lidar com o que não é igual ao que já conhecíamos. Até que sejam realizadas, as viagens são como parênteses vazios, colocados em um ponto à frente, prontos para serem preenchidos com narrativas diferentes dos usuais. Tem viagens alucinadas, aquelas dos que vão para não voltar. Tem viagem psicodélica, bad trip, e tem também viagem de pesquisa de moda. Estas eram de um jeito. Hoje são de outro. O campo da moda cresceu, bebe na sociologia, filosofia, semiótica, etnografia, antropologia, cinema, artes visuais, gastronomia, tecnologia, estatística, química e descamba em museus, clubes e em gente passando pela rua. A rua é uma fonte do passado que não perdeu força. Ao contrário. Ela não é erudita, não é especializada, e nem por isso desprivilegiada. Cada um que passa veste um manto de implicações subjetivas, sociais, etc., etc. Uma vez encontrei um profissional em viagem de pesquisa. Convidei-o para assentar um pouco e ver o movimento. Era grande o fluxo de passantes, mas os vazios entre uns e outros criava contornos bem definidos contra o paredão do edifício ao fundo. Fazia calor e era um dia perfeito para observar como as pessoas respondiam ao clima, suas escolhas de cores, as proporções, as combinações de estampas, a adequação com o biótipo, o desempenho dos tecidos, a modelagem, a identificação de marcas, os comportamentos por faixa etária, nível social, hábitos coletivos e singulares, e vai por aí. Insisti outra vez, mas ele argumentou que não tinha tempo a perder, e nem via nenhuma vantagem em ficar ali parado. Eu fiquei por lá. Viajando, como ele mesmo disse. Notei uma indisfarçável conotação pejorativa na palavra viajar.

Moda e humor

Há alguns anos, a busca de um mote para uma campanha do Sistema UseFashion convergiu até o bolo que ilustra esta página. A ideia era associar objetos fora do terreno da moda com ela mesma. Uma forma didática de explicitar processos e possibilidades de pesquisa e criação. No caso do bolo, este palacete rococó de três  andares, a relação estabelecida caiu nos rufos, bordados e laços românticos cor de rosa. Funcionou. No mês seguinte, um lagarto fake, tão verde quando o bolo era cor de rosa, virou o novo garoto-propaganda ao lado de bolsas em couro de crocodilo. Este recurso, de estabelecer vínculos e sentidos pela justaposição de imagens, é um velho truque semiótico. No campo da moda, ele é arroz de festa nas escolas, mas ainda surpreende boa parte da indústria quando empregado para auxiliar na construção do objeto de moda, e não para vendê-lo. No site www.trust-fun.com vi montagens parecidas com a do bolo. No caso, o objetivo era outro, o humor, puro e simples. As imagens estavam organizadas como fatores de uma conta de somar e o resultado eram estas paródias divertidas de looks de moda. A verdade é que todos eles eram realmente vulneráveis à brincadeira, como é possível conferir. Temos, então, o mesmo recurso com destinos diferentes e uma conclusão besta para este texto, travestida de receita, mas que pode ser útil para nós profissionais do ramo, eventualmente acometidos de tensões e dores inexplicáveis no dia-a-dia de trabalho. Moda é negócio, é cultura, mas é como um  entretenimento: se não dá para rir de si mesma, aborrece, e o que é pior, também não vende.

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