Shame é o cinema do anticlímax

Shame é o cinema do anticlímax

4 de março de 2012 Arte 0

O filme Vergonha (Shame)  contorna os recursos narrativos aos quais o cinema nos viciou afim de contar a estória de um viciado em sexo. A narrativa, no caso, é algo que se estende dolorosamente, sem picos, e às vezes em sentido inverso, nessa descida ao inferno da dissolução dos sentidos, e considere a palavra sentidos em toda a extensão de suas possibilidades. Brandon, o personagem conduzido pelo extraordinário Michael Fassbender, trabalha em um escritório de atividade  indefinida em Nova York  e cumpre uma rotina impessoal de deslocamentos entre o apartamento, o metrô, os elevadores  e as salas de vidro com homens de terno dentro. Incrustado nesse cotidiano está o sexo. Brandon vai ao banheiro do escritório e masturba-se, leva prostitutas para a cama, envolve-se em qualquer oferta de sexo casual e dedica-se a ver todo tipo de pornografia na internet. Nesse jogo, marcado pelo desconforto e pela expressão petrificada de Fassbender, irrompe Sissy, irmã do personagem e interpretada pela Carey Mulligan. Sissy é claramente disfuncional e protagoniza uma cena insuportável, do tipo que vai definindo o cinema do diretor Steve McQueen.

Em dado momento ela canta sem convicção uma versão desacelerada de New York, New York e o diretor sustenta a coisa em tempo real. Semelhante é a sequência em que Fassbender conversa com uma colega de trabalho que convidou para jantar.

Ao longo do filme acompanhamos a vida sexual de um homem atraente, mas a cada momento em que o sexo acontece ele está marcado por um dano irreparável. É um cinema de anticlímax esse, como é arriscada a fronteira entre a possível pauta moralista e o retrato de uma época definida pela solidão e pelo simulacro de prazer, sucesso e felicidade. Mas o que temos aqui não é uma “moral” e sim o privilégio de assistir a construção de um cinema que busca outra forma de abordar uma realidade em que as questões já não são mais aquelas que nos mobilizaram em passado recente. O diretor Steve McQueen, que migrou das artes visuais para o cinema, e já realizou o excelente Fome (Hunger), assume abertamente essa intenção.

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eduardo:

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